terça-feira, 30 de junho de 2009

da construção do mundo

ter um
sonho
criá-lo
terra e água
pedaço de paraíso
pouco de azul
algum de verde

aqui

deixar a bola de sonho rolar
com nódoas de vida
manchá-la de homens.

segunda-feira, 29 de junho de 2009

quietude da aragem

(Juan Muñoz)

Nascendo com as cores
da fuligem, edifico-me
na espessura do choro
que emprenha as letras.

Apagarão o meu nome em breve. De que vale
uma árvore bela
se está
plantada no lugar da ausência? O meu
odor é a desilusão

e tu não estás a ser tudo. Despenho-me
em ti, rapariga do sul. E já não cantámos,
passámos pelo sorriso sorrateiramente
quando tudo nos obrigava a parar
e contemplar. Passámos pela ascensão,
pela expressão, e fica apenas o sotaque
das nossas
pegadas.

Terás perdido o encanto? Terei ficado
aborrecido excedendo
cadavérico,
homem-esquelético rasgado

no arame farpado do amor
circular? Sei a resposta
desde que fomos nascendo
da fuligem
para a inábil maneira
de viver com a cabeça
desamparada de competências.

Esquece o poema, inala o cheiro
vertente dos meus olhos e morre
na pele da minha
garganta. Extinção do
hostil eco.
******

pedro s. martins

sueño

vengo
sin vestido ni oraciónes
a envolverte en el sacro oficio
de saber tu sexo parte a parte.
 
vengo
a devorar una a una tus derrotas,
a darte un poco de tu piel,
a lo que esperas.
 
vengo
a ponerte mi cuerpo entre las manos,
a volcarme de tu boca.
a girar toda sobre tu cuerpo ardido.
 
vengo
a intentarte entre mi pecho,
a dejarme escrita en la memoria
de tus labios.
 
vengo
al suspenso, hombre,
de mirarte cuando lengües mi aura,
mis orillas

cuando invadas la hondura de mi origen
y me alcances,
te disuelvas.
Me nocturnes,
y te abismes.

Vida Animal

sou do tempo em que os animais sonhavam. nem sempre
sonhar cegou como um cancro silencioso. sou do tempo,
como outros são de alguém com muralhas ou de um lugar
ao qual inventaram fome. peso aproximadamente 37 gramas
na colher com que deus rapa as cidades nos dias em que a
fé insaciável corre perigo. já amei os animais em contraluz.
e um animal que podia ver-se claramente. sonhei-o no limiar
do apodrecer furtivo das carnes. já descarnei o amor com
o cutelo das palavras. afiei os gumes lustrosos do silêncio
na pedra dos ossos. o sangue cristalizando à solidão. e era
noite cortante no poço da memória quando o ventre azul
das nuvens se precipitava no espanto agoniado das asas. já
me banqueteei na intangível estupidez ufana dos anjos. eu
já me perdi. atirei pedras ao coração quando ninguém via.
já estive ocupadíssimo à espera de amanhã. sou do tempo
que nunca chega. sou da espécie de fantasmas que se senta
no sentido inverso da marcha dos transportes. já vi a vida
andar para trás, acreditando haver tesouros lá no fundo das
crianças. conheci pela primeira vez o som da mão quando
me agarraste pelo poema. perdi tudo na reviravolta violenta
do horário de saída do coração. eu sou do tempo em que os
animais já não arranjam trabalho. com uma mão irrompo no
peito próprio e sustenho o coração para saber o que foi. o que
fui. sou da estação em que é fria a reencarnação da mentira.
havia animais debatendo-se convulsivamente como um músculo
de verdade, a morte luzia no escuro quando sonhavam. na mão
restante tenho força para derrubar qualquer animal sorrateiro
aproximado do avesso que sou. do tempo em que cada palavra
se vergava no dealbar da extinção para o nascimento da seguinte.
sou do tempo em que animais perdidos conheciam a posição exacta
da própria ausência. falavam vagarosamente, como se estivessem
para chegar. como se o passado fosse um instinto de sobrevivência.
como se não fossem do tempo. rumina silenciosamente, regurgita
silenciosamente

Os Olhos de Himmler - Rui Nunes

Os Olhos de Himmler - Rui Nunes

Edição: Relógio D' Água - 2009

"— olha. Olha o gajo,
e o bando volta‑se, têm blusões de couro, kispos, botas cardadas, o dedo indicador apontado para ele. E riem. Não lhes vê as caras, não as consegue ver, confundem‑se com as outras que passam, com a oscilação da sombra das árvores, com algumas folhas em queda, são borrões cheios de grúmulos escuros. Carne: murmura. Carne: repete. Um monte de carne. As mãos agarram‑na, erguem‑na, e depois atiram‑na para o cepo. Um som molhado e flácido cola‑se à madeira e espalha‑se nela, como água que se derrama: Uma bela carne. Os rapazes ainda ali estão, mas encostados a uma casa, uma perna dobrada e o pé apoiado na parede. Têm as mãos nos bolsos. E parecem esperar. Às vezes, voltam‑se uns para os outros e falam. Outras vezes, falam sem se voltar, olhos fixos na rua, como se falassem para ninguém. São palavras isoladas, talvez insultos, que fazem virar a cabeça a algumas pessoas, e apressam outras. O homem passa os dedos pela casca de laranja. E os rapazes aproximam‑se dele, aos pares, os ombros gingam, acompanhando o movimento dos pés. Os blusões abertos mostram as T.shirts brancas cujas pregas se desfazem e refazem ao ritmo dos passos. Cercam‑no. São tantas as cabeças inclinadas para ele, lá no alto, deixam entrever a copa amarelada das árvores, com os seus buracos de luz. A boca de um poço. Ouvia‑se a rapariga a gritar: estou aqui, estou aqui. Olhava‑se em volta e não se via ninguém."



O mestre está de volta.

domingo, 28 de junho de 2009

Agora o SILÊNCIO

Trouxe-te um presente para leres,
desembrulha a pétala,
bebe o pólen:
este poema é líquido.
Mais logo quando te cair a estrela
poderás bebê-lo a dois, a sós contigo.
Peguei no teu avesso.
Eras mais mãos do que pernas ou braços,
eu teria por missão medir-te os dedos,
mas todos os dias expandias-te em esqueletos,
que recortavam a paisagem-
ora árvores, ora gente em sombras,
extenso areal de poema,
ou forma-amor.

A tarefa era morosa,
porque enquanto o vento te sorvia as palavras,
os violinos tocavam-te as cordas vocais,
mas nada disso esteve para se cantar.
Disse-te alguma vez que o silêncio te assenta bem?

Foram tempos dedicados a medições efémeras.
reparei de súbito, que afogada na tua desproporção,
tornara-me mais alta do que a erva onde pousam os insectos ,
como se assim,
aprendendo o inverso dos tamanhos,
visse de novo a repetida janela,
em metamorfose,
alterando os ângulos do usado.
Este vestido foi teu,
dançei-te nele quando te via em
antítese da vida.
Parei quando desististe de morrer depois da queda,
por saber como te fazia feliz a morbidez.
Quantas vezes nos morremos?
Para mim, por favor, um abraço ou uma corda,
qualquer acto que te agarre
ao movimento das letras,
desde que não deixes a noite em tamanho certo de fotografia
de parede,
ou pintura barata que suja os muros dos meus pulsos,
onde passeias ao sabor do morno sangue,
passageiro do vôo número teu
em bold arrredondado de mim.

os olhos do coração (da gárgula)

A estrada cresce
na boca de criança. Rasga-lhe
a cara até à adolescência. Sente o frio
de tudo o que não é teu, gárgula
humana.

Por dentro a loucura misteriosa
que se debruça sobre
os vícios. Constrói a destruição,
calcorreando tantos (todos?)
atalhos para
a perda e morrerá
pela espinha do mau
caminho.

Acha-se estrela de filme, lufadas
de delírio, a invencibilidade
do prodígio. Na testa,
a estupidez
de ainda não ter ultrapassado
a árdua tábua da vida.

Já viste a tua mãe,
rapaz? Desertou!,
e é nas ondas que ela voltará (se). Pensas
que sabes tudo sobre
todos que não te partilham o sexo. Da testa
aos pés, viraste mestre da anatomia. E se eu,
apenas eu,
te perguntar o que é um
vergão,
saberás dar-me a resposta?

És criança; animal, rapaz; animal;
homem; flanco descontado
na espuma da vida. Sim,
morrerás pela espinha
da tua existência
menor.
******

pedro s. martins

sábado, 27 de junho de 2009

Autosacramental a la cera perdida

Triste el día
si sólo sucede a la noche
y este girón florido
contracara de un recuerdo.

Bestia de costumbre fatigada
Insomne
resto de neblina
y cantas
como quien vuelve
a su don
a su provincia:

Sed de la gota serás
sobre una telaraña desnuda.
Te armes en tu corazón
y te defiendas!

O suicídio do optimista

(mark ryden)

Esta estrada vai até à crispação
da beleza. Fôlego ante fôlego sinto
o final dos teus olhos. Toco-os
com a suavidade da chama
que se desfaz de púrpura em alaranjada.

Perco o alumiar da vida na metáfora
da chama. Tudo
se calcina depois
do poema: espelhos, carne e o terror
do finito arrepio cantante onde
vou escondendo o sentir-te.

De coração aceso, desço
à polpa desta perda. Defendo-me
com as artes que fui aprendendo
ao longo do tempo e a voz
é engodo
e o pensar curva em artéria. Sobram

os olhos.

Os olhos que me fizeram
seguir a estrada na abertura do poema
e agora são receptores
a um novo mundo
deglutido. Nele,
defendo-te o bárbaro casulo
para onde migraste.

Morreste de uma maneira soberana. Dois anos;
nove anos? Sete anos e todas as luas
ainda matas
quem te procura no final da estrada.

Morro de cabelo frio e cara exaltada há todo
esse tempo!
Ainda não me habituei à ideia
que a minha partida final
será só.
*******

pedro s. martins

O QUAM CITO TRANSIT GLORIA MUNDI


sereia regada que estalagmitamente ecoa no transconsciente que horas trazes,
traz-me o odor-vácuo do que ainda não li e os suores beijados dos ninhos entre as teclas do piano
traz-me a desarmonia em puzzle, os ventos que te enrugam, os inimigos com quem podes contar, os ses
traz os perfis das estações e dos lirismos ensanguentados dos pássaros, e as bíblias
dos desencantados
traz essa canção-punho que rege o oceanar tertúlio dos fundos dos ventres de quem sabe
e quer saber

e conta o que se faz nas tuas escamas-escada-liberdade
e cinge os adeus e olás e olhares espessos impessoais
corta-os numa lágrima fundida dum beijo lânguido no epitáfio
cisna-os no tactear das páginas que escorrem perante sarjetas
que conhecemos

Não tenhas receio do mármore, nem da letra nem do escuro
Não venhas sem horas, nem sem rugas, nem sem morte
Vem como estás e como és
sereia seca que estalactitamente cala no consciente

*pintura de Fred Einaudi

Visión

Todo lo que con sabiduría olvides caerá sin apuro desde la inmensidad de un estante.

Oh Medusa!
qué sola te resuelves
bestia infinita
en la intuición
de la carne viva
en el cigarro de esperar el carnaval
y ovulas
y sabes que lo concebido es deuda
que nos quitará la palabra
el innombrable pez que canta,
la luz de gas que espera
en el próximo pulsar
antes de nosotros
como un descanso
una deriva.

Undeware

No todos los cuerpos son iguales
(donde algunos tienen el tacto
otros tenemos la memoria)
por eso un hombre pidió hablar.
  
Habló de otras costas,
de lugares que son ningunaparte,
de las curiosidades del lenguaje,
y de unas bolsitas de nylón
que se venden en Foz.
  
Saldo y, contraflor al resto,
le vi la cicatriz.
Al costado de la cara
una marca, quizá,
de un gesto insolidario
 
Se puso una sonrisa en el sombrero
y como un tirano
señaló la luna
 
             Como un sabio
             me dejó partir

( A veces los cuerpos se parecen
- reconocen –
aunque yo no tenga cicatrices en la cara)

sexta-feira, 26 de junho de 2009

VIDAS EMBALSAMADAS

Uma ferrugem de silêncio empolou o bafo etílico da criança.
A mãe grevista lia revistas azul-fininho.
A irmã que berrava muito foi sufocada pelo pénis do pai.
A criança brinca com as fezes do irmão
e sonha traficar papel higiénico no hospital psiquiátrico mais conceituado do mundo.
Bendito seja o ventre do vosso Deus.

Nada que ver con la inmortalidad

Da pereza ponerse difícil,
dar vuelta la vida
o el mantel.

Si todo lo que está del otro lado
es claridad
sólo es desborde
que en aire se afirma

¿habrá un espacio
para conjugar la palabra
o el tiempo
sin desatender la respiración?


Verdad no debería haber
qué importancia tiene la adivinación
si todos somos inmigrantes,
si las trincheras
son escenario
y decadencia,
suite menguante
que no alcanza a sostenerse
de porque es su olvido.

A palidez do frigorífico não abona a favor da fome



*foto de Chema Madoz

uma.gravidez.vomita.uma.mão.que.desampara


Caía montes de água na água dos montes.
Pensei que era um anúncio. Sorri.
Ele riu. Não tinha dentes podres. Gostei.
Trocámos o currículo.
Fez-se sol. Pontes.
Ouvi "lambia-te o priúdo todo". Não sorri. Mas caí.
Desci nopoço, e lambida gostei.
Senti um pénis nas amígdalas.
Sufocava de prazer.
Ele puxava-me os cabelos, como se a chuva fosse descer.
Senti o corpo efervescente com o ferro em brasa a marcar.
É isto o amor, afinal!
(pensei)
E nunca mais o vi.
Cresceram-me outras amígdalas.
«afinal o filho foi de Deus, mamã...»
Acho que ela, católica, nunca acreditou.
Fui nadar na chuva dura dos montes...


*quadro de Fred Einaudi

Cortado a Meio

Era um menino prodígio muito peculiar : lia livros apenas
até metade da estória.

Debaixo dos lençóis, com a ajuda de uma pequena lanterna.

À medida que a leitura decorria , o entusiasmo esmorecia.

Era como se fosse um membro da assistência percebendo
o truque mágico da mulher serrada a meio.

E ficasse fascinado apenas por uma das partes.

Porém, não ficava triste, pois o entusiasmo, como um cigarro
mal apagado, reacendia-se sempre na abertura de um novo livro.

Quando se sentia aborrecido, deixava que a memória se recreasse,
baralhasse as cartas do sonho: cosia um romance de aventuras a um
enredo existencialista, um livro de poemas a um ensaio de teoria política.

O menino fez-se adulto, o adulto fez-se velho; o velho fez-se pó ou cinza.

Levou a sua vida até ao fim, ao contrário da sua biblioteca, composta

por tantas e tantas vidas cortadas ao meio.


Bruno Sousa Villar

A arte de Lasse Gjertsen



Lasse Gjertsen (born 19 July 1984) is a Norwegian animator, musician, and videographer known on YouTube as lassegg. He is best known for his short pieces "Hyperactive" and "Amateur", which string together short clips of video to create a unique form of video akin to stop-motion animation. His "Hyperactive" video has over 15 million views.

Gjertsen was born in Larvik, Norway. The 24 year old studied animation at Kent Institute of Art & Design in England, and at Volda University College in Norway. His time at Kent Institute ended with his teachers failing to appreciate his work, specifically Hyperactive.

Lasse originally submitted Hyperactive to YouTube after seeing a copy uploaded by another user with poor sound quality. Over the next six months Lasse uploaded 16 more videos, many created during his animation course. As of May 12th 2007 he has the 31st most subscribed channel, and four videos have been featured on the YouTube front page, Hyperactive, What The Fuck?, Amateur, and Sogno ad Occhi Aperti. While Hyperactive has been the most popular, Amateur was featured in an article in the online edition of the Wall Street Journal.

Another video by Gjertsen has also been featured on YouTube; "Hva faen, Speil?" in which he is looking into a mirror while some of the effects of LSD become apparent through very clever video and audio editing.

Lasse Gjertsen's video Hyperactive was nominated in the category Most Creative video in YouTube's 2006 Video Awards. The video achieved third place.

Hyperactive was copied by Cartoon Network in an advert for the show "Foster's Home for Imaginary Friends". Lasse initially considered legal action but after talking to a lawyer decided it would be too arduous.

It was also spoofed in an advertisement for the 3rd season of the FX TV show "It's Always Sunny In Philadelphia." Whether this was done with or without Gjertsen's permission is unclear.

Lasse Gjertsen is also the creator of the soundtrack of the Chaplin Snakker video's on YouTube. Chaplin Snakker is one of his electronic songs, in which the freedom- and awe-inspiring speech of Charlie Chaplin from his movie "The Great Dictator" (1940) is elevated by the use of music.

The YouTube success has resulted in offers from international companies like Chevrolet and MTV. However, Gjertsen publicly denounces the concept of advertising, considering it below prostitution, and has refused all such offers.

In addition to his video work, Lasse has a self-produced album of electronica music.

In 2007 Lasse worked on a two part music video collaboration, named Sogno ad Occhi Aperti, with the Italian Cellist Giovanni Sollima. This was presented at the 8th International Fringe Film Festival in Marzamemi, Italy. In the same year he directed the music video for the Swedish rapper Timbuktu's song "Get Fizzy".

Lasse Gjertsen´s myspace - http://www.myspace.com/lassegjertsen
Lasse Gjertsen´s youtube - http://www.youtube.com/profile?user=lassegg

* wikipedia